Descortino no Museu
Por Nina Clarisse [sobre a exposição Museu mise-en-scène na Zipper Galeria, 2017]
A possibilidade de ver as luzes de um céu estrelado se dá na medida em que mais escuro estiver ao nosso redor. A maior nitidez das luzes estelares é proporcional à escuridão que nos cerca. Na exposição museu mise-en-scène, Isis Gasparini parece deslocar a regra astronômica para o interior dos museus. Cenas que a princípio são tão cotidianas – como a presença dos visitantes em frente às obras – adquirem aqui a iluminação que nos enfeitiça tal e qual o deslocar milimétrico de uma estrela: não nos é possível ver seu movimento, mas o fascínio da luz exercido na imagem nos permite estudar o trajeto existente ali. Entre a exibição de quadros históricos das artes, Gasparini escolhe nos revelar, pela luz, um tempo anterior, e com isso, é capaz de transformar o supostamente habitual no sublime da observação da imagem estelar, àquela mesma que revela um passado, a saber, o de nossa origem.
Se é pela análise da luz que conseguimos datar nosso início, é também pela expansão do Universo e o distanciar das estrelas – que ficam cada vez mais vermelhas (efeito Doppler) – o que nos permite ver a escuridão espacial. O manifestado como um imenso escuro, portanto, é um jogo de luz que, pelo seu afastamento, envermelha-se gradativamente até se ocultar por completo. Os tão notáveis vermelhos que compõe esta exposição parecem estar por nos avisar o que na luz e em sua ausência traça não apenas a história da arte e da fotografia, mas nossa própria história, intensificando a aguda esfera existencial das imagens ali exibidas.
Assim como no paradoxo da noite escura, Gasparini oferece-nos outra dialética: a luz que nos impede de ver. Estourada velando a face ou a que se faz presente, entretanto não demonstra seu conteúdo pelo contraste de sua força e o movimento das cortinas. A artista, deste modo, apresenta-nos em seu jogo de claro/escuro o que Agamben parece expressar por palavras: “O único conteúdo da revelação é aquilo que é fechado em si, o que é velado – a luz é apenas a chegada do escuro a si próprio”.